adoção envolve aspectos tardios e inter-raciais

matéria publicada no site MSnoticias

Amor à primeira vista. Assim pode ser chamada a adoção de Wellinton, um adolescente de 13 anos, por Maria Alice e João Ricardo, um casal com quase 60 anos e duas filhas biológicas, uma de 29 e outra de 30 anos.
Os dois são dentistas aposentados, mas ele ainda mantém o consultório na Capital.Eles abriram o coração para um novo amor: um adolescente da Comarca de Coxim que, mesmo estando há pouco mais de 40 dias (contados pela mãe) com a nova família, já se sente em casa.
Maria Alice sempre quis adotar um menino e o marido nunca havia concordado com essa possibilidade até conhecer o garoto.No começo ela ficou um pouco assustada com a nova estrutura familiar, mas a sensação passou logo. “Está sendo muito interessante, uma renovação”, contou a dentista, mencionando que o menino ainda não a chama de mãe, porém ela acredita que isso acontecerá com o tempo. “Ele não consegue porque não está acostumado. Não vou forçar nem cobrar”.
João Ricardo explica que não desejava adotar anteriormente porque já tinhas as filhas, contudo se decidiu pela adoção quando percebeu a oportunidade de transformar a vida de Wellinton, de possibilitar a ele o acesso a uma família, à educação, à cultura, enfim, uma vida digna em sociedade.“Ele é um amigo que está sempre comigo. Acompanha-me nas caminhadas, no consultório e me possibilita mostrar que existe um mundo melhor, mas ele tem que conquistar suas próprias coisas. Tento ensinar a ele noção de valores”, contou.
Questionado sobre o título de novo pai, João Ricardo brinca: “Uma hora ele me chama de pai, outra de tio – acho que vou precisar de analista”. O dentista sabe que, com o tempo, a palavra pai sairá do menino naturalmente.Segurança – As percepções sobre a transformação na vida do adolescente com a adoção aconteceram em momentos diferentes. Maria Alice sentiu que o olhar triste do filho desapareceu quando eles conversaram sobre a possibilidade de adoção. João Ricardo acredita que o sentimento de segurança surgiu no garoto no final da audiência em que foi concedida a guarda provisória.
Nem Maria Alice nem João Ricardo perceberam nas pessoas que os cercam nenhum tipo de preconceito quanto ao novo filho, por ser ele adolescente ou ter descendência negra. Ambos contaram a seus familiares e notaram somente alegria. João Ricardo já levou Wellinton para tirar a carteira de identidade.
Inter-racial - Na adoção de Wellinton dois aspectos importantíssimos devem ser considerados: adoção tardia, envolvendo crianças com mais de três anos, e inter-racial. Questionada sobre a adoção, a assistente social da Comarca de Coxim, Doêmia Ignez Ceni Gomez, comemora a nova família e lembra que casos como o de Wellinton não acontecem todos os dias. “Precisamos trabalhar mais a sociedade para que o adotado não carregue o estigma de abrigado. Nosso trabalho é inserir a criança na comunidade, mas a própria sociedade a discrimina.
Exemplos como o de Maria Alice e João Ricardo, de amor ao próximo por pessoas que optam pela adoção, deveriam ter efeito multiplicador. Esperamos que um dia a sociedade entenda que adotar é dar amor. Só isso”, disse a assistente social. O novo pai aproveitou para questionar a mentalidade de pessoas que preferem adotar somente crianças recém-nascidas, brancas, de olhos azuis ou verdes e lembrou que se não houvesse tanto preconceito, crianças e adolescentes não ficariam tanto tempo nos abrigos à espera de adoção.
A adoção de criança com características raciais diferentes daquelas dos pais adotivos, em alguns casos, é motivo para preconceito duplo: um pela adoção e outro por esta diferença, contudo se ressalte que a cor da pele ou dos olhos não determina o sucesso de uma adoção. O sucesso está na experiências positivas na nova família, no carinho, na orientação e no amor. “Infelizmente no Brasil a cultura da adoção ainda não é como deveria ser. Os candidatos a pais querem crianças brancas, recém-nascidas, que possibilitem a busca de semelhanças físicas. Poucos têm a coragem de adotar uma criança de cor diferente ou adolescente, acrescentou Doêmia.
Para ela, a adoção deve transcender o espaço físico: deve se originar na alma. A assistente social acredita no desprendimento e no potencial de amar do ser humano. “Li o depoimento de uma mãe adotiva de quatro filhos que me impressionou. Ela disse que teve quatro filhos com a carga do DNA da alma, cada um a seu tempo e com traços pessoais encantadores. Por que não podemos ter mais pessoas assim, que se dispõem a amar incondicionalmente? Pessoas que não se preocupam com idade ou cor, que querem apenas amar? Elas existem sim, temos apenas que encontrá-las e apresentá-las às crianças disponíveis para adoção”.
Adoção famosa - O ator Marcelo Antony é pai adotivo de duas crianças e conta sempre sua história em meios de comunicação, na esperança de ver seu exemplo seguido. Inicialmente ele queria adotar uma menina, recém-nascida, branca, saudável, do sul do país, descendente de europeus. Adotou Francisco, um menino, mestiço, de nove meses de idade, que nasceu prematuro e com uma hérnia umbilical. Depois de algum tempo, adotou Stephanie.
Antony lamenta que, sempre que é citado em companhia de Francisco e Stephanie, a imprensa se refira a eles como filhos adotivos. Para o ator, eles são simplesmente filhos.
04/02/2009 - 08:04